Quem é livre tem “déficit de atenção” aos olhos do escravo

Quem é livre tem “déficit de atenção” aos olhos do escravo
"Wanderer above the Sea of Fog" painting by Caspar David Friedrich (1818)

Manifesto da Atenção Livre

O texto que você lerá a seguir é afirmativo das características hoje associadas ao diagnóstico de TDAH. Faz a defesa da comunidade TDAH como uma minoria perseguida, argumenta interessadamente por nossa superioridade cognitiva, intelectual e mesmo moral ante as pessoas ditas normais, acusa a sociedade, a ciência e a medicina de estupidez, tirania e obscurantismo e, por fim, conclama uma rebelião dos TDAH contra o sistema persecutório que ameaça não só sua existência enquanto raça, como também a existência da própria humanidade e seu futuro. Dito isso, o leitor deve prosseguir por sua própria conta e risco, correndo o risco de ficar ofendido, achar absurdo ou dar risadas. Tudo bem, esses são também objetivos deste texto. O leitor corre também um risco ainda maior: ser convencido.

TDAH, ou transtorno de déficit de atenção e hiperatividade é um rótulo criado pela medicina para explicar por que uma fatia minoritária mas significativa da população nasce com uma mecânica de atenção completamente diferente da maioria. Vale dizer que atenção é para mim assunto muito sério. Não porque eu tenha sido diagnosticado, mas porque atenção é muito mais do que o elemento banal a que foi reduzido pelo cientificismo contemporâneo. Atenção é o fenômeno psicológico observável mais próximo de um dos maiores mistérios não resolvidos da humanidade: a consciência. Atenção é a parte visível da consciência e sua expressão mais direta. É o sinal da existência do self, que lança seu olhar sobre uma coisa e não sobre outra. É apenas porque há atenção, que sabemos que há consciência. Se a ciência crê na existência da atenção, então também crê na existência da consciência e essa constatação tem implicações nada banais. É apenas porque a atenção flutua e foge ao controle externo (da sociedade) e interno (do ego) que nos diferenciamos de máquinas. Um termostato de geladeira é atento, mas sua atenção jamais se desvia porque não tem consciência. A flutuação da atenção é a única prova que temos de não somos máquinas e minha tese aqui é que a cultura atual desejou tanto crer que sejamos máquinas a ponto de transformar nosso maior trunfo em uma doença que acomete aqueles que demonstram esse fenômeno de forma mais aguda. Atenção é portanto um conceito filosófico, fundamento epistemológico e um campo de luta social. Sim, luta social porque basta olhar em volta e perceber que a guerra do século XX e XXI é a guerra pela atenção, ou seja, pela captura da consciência. Os governos mais poderosos e as maiores corporações contemporâneas vivem e respiram pela atenção de cada indivíduo do planeta. A definição do que é atenção, que tipo de atenção é desejável, como medir a atenção, que alvos de atenção são considerados objetivos ou reais e quais são considerados subjetivos ou irreais, tudo isso são arenas de luta pelo poder. A definição do transtorno de déficit de atenção é portanto um campo definido onde podemos observar diretamente essa engenharia e essa luta cultural.

Penso portanto que existem dois tipos de pessoas quanto à questão da atenção. A maioria, conhecida como “neurotípica”, está geneticamente programada para a obediência atencional. Digamos que são as pessoas que têm um tipo atenção servil, passiva, submissa, instrumental para outros tratos da personalidade tais como a necessidade de aceitação social ou a assim chamada racionalidade prática. De outro lado há uma minoria geneticamente predisposta à desobediência atencional. São pessoas que têm atenção espontânea e livre, não submissa, preponderante sobre outros tratos da mente. Nestes a atenção é que comanda as demais funções, que lhes são subalternas. Nestes a consciência não se submete à mente. Neles, o self tem o comando da atenção e esta não está submetida ao ego. Tal processo de submissão da atenção faz parte do processo de desenvolvimento psíquico do neurotípico. No sujeito de atenção livre essa captura e domesticação da atenção não acontece plenamente em momento algum do nascimento à morte. Esse fato demonstra duas coisas: primeiro, a resistência e resiliência dessa estrutura neurológica e de personalidade, com raízes mais profundas que a força dos ventos da conformação social; segundo, a razão pela qual a ciência cognitiva tomou o caminho fácil de rotular essa estruturação atencional como uma lacuna no desenvolvimento e, consequentemente, fazer da criança alvo primário do sistema de repressão à liberdade atencional. A expressão “desenvolvimento”, tipicamente positivista, já diz muito. Trata-se de um roteiro pré-estabelecido para a fixação de padrões comportamentais em favor de uma ordem social cujo objetivo primário é maximizar a eficiência na divisão social do trabalho.

Ao definir a atenção livre (rotulada de TDAH), a ideia mais repetida (com proposital displicência conceitual) é a de “desatenção”. Ao TDAH, faltaria atenção. A primeira coisa que precisamos entender é que não existe desatenção. A consciência, ao contrário da vigília, da razão ou demais camadas superficiais da psiquê, está permanentemente ativa. Tudo mais são meros objetos que surgem no campo da consciência, sejam objetos internos (pensamentos, sensações e emoções) ou externos (estímulos sensoriais). O inconsciente nada mais é do que um objeto que tem a atenção da consciência-self sem que tenha atenção do Eu vigil. Portanto, mesmo o sujeito mais avoado e distraído está seguramente atento a algo. Quando se diz que alguém está desatento o correto seria dizer que está desatento a algo específico. Esse procedimento simples de honestidade intelectual demonstraria que o debate não é sobre a capacidade de atenção, mas sobre a importância relativa dos objetos propostos à atenção.

O que atrai e retém a atenção? A resposta é: sentido. A atenção é atraída por um signo ou índice (um sinal externo e objeto da consciência) e mantém foco sobre ele enquanto produzir sentido.

Nas pessoas neurotípicas, de atenção servil, o foco de atenção (sendo subalterno) é relacional. Interessa-lhe o que é de interesse de outros, como instrumento de troca social. O dito “atento” é tão somente “socialmente atento”. Dá e mantém atenção àquilo que outros esperam que dê e mantenha atenção. Assim, a atenção do neurotípico não tem vontade própria e, portanto, não está sob controle do self. Ao invés disso é comandada pelo ego que, por sua vez, é formado e comandado pelo espaço social. O neurotípico não é “atento”. É submisso e obediente.

Nas pessoas de atenção livre ou espontânea (chamadas de TDAH) o vetor de atenção não é relacional, ao menos no sentido social. O ponto de partida desse sujeito é a atenção difusa, equivalente ao estado que se procura atingir na meditação. A atenção está inicialmente ociosa e predisposta a observar qualquer acontecimento na consciência. Com isso, a atenção livre é facilmente atraída por elementos internos ou externos que passam despercebidos à atenção servil, que é instrumental e não está ativa quando ociosa. A atenção instrumental está sempre ocupada em atender demandas externas sem falha. Já a atenção espontânea é não-relacional e não-instrumental. Não hierarquiza estímulos sob critério externo e segue instintivamente o campo dos signos em busca de sentido. O foco se manterá firme enquanto essa relação direta com o mundo der frutos. Depois disso, ocorre rápido desinteresse e ela é atraída por outro estímulo, mais promissor.

Uma das maiores contradições da patologização direcionada à atenção livre é a atribuição simultânea de características contraditórias. Segundo o manual cientificista, o TDAH tem déficit de atenção, ou seja, dificuldade em manter a atenção. Segundo o mesmo manual, o TDAH tem tendência ao “hiperfoco”, ou seja, ser profundamente absorvido por um objeto por muito tempo, a ponto de ser difícil atrair sua atenção para fora dele. Como? Hiperfoco? Mas o problema todo não seria incapacidade de focar? Pois então. Contrariando o estereótipo do distraído e volúvel sujeito que não dá mais que um minuto de atenção a nada, o agraciado com atenção livre é perfeitamente capaz de focar em algo, contanto que esse algo seja relevante, interessante e cheio de sentido para o Self. Mais que isso, a mesma ciência cognitiva coleciona evidências de que essa minoria, quando focada, tem capacidade de manter atenção longa e profunda, muito acima do neurotípico cuja atenção é frágil, vacilante, e necessita de comando externo constante.

Isso explica porque muitos dos maiores gênios da história tinham muitas características compatíveis com o que hoje se identifica como TDAH: criatividade, múltiplos interesses, associações de ideias, desatenção às tarefas propostas por outros e também o “hiperfoco” capaz de produzir obras-primas. Esse fato por si só deveria ser suficiente para implodir a ideia de que esse estrutura atencional seja um “transtorno” mas, como vemos, são muitos os pontos cegos, atalhos e malabarismos executados para garantir a proliferação da ideia de que a atenção livre e espontânea seja característica de pessoas inferiores quando todas as evidências apontam precisamente o oposto.

Como a máquina social se beneficia dos neurotípicos de atenção servil, o attention span dessa população serve de norma para todos os outros. Os sprints e maratonas impressionantes de atenção plena dos indivíduos de atenção livre precisaram necessariamente ganhar algum sentido pejorativo e patológico. Agora estão focados “demais”. Você tenta tirar-lhes a concentração, mas eles se mantêm focados naquilo que os interessa naquele momento. Você fala e o TDAH não escuta ou não registra o que ouviu. Veja que é exatamente o oposto do alegado anteriormente. O sujeito de atenção livre, segundo essa lógica tautológica, está sempre errado. Está errado quando foca sua atenção e também está errado quando não foca. Fica assim demonstrado que o real problema em discussão jamais foi atenção, mas obediência.

O portador de uma atenção espontânea não é capaz de fazê-la obedecer à autoridade social. Veja que o problema não é sequer de obediência ao ego. Há incontáveis transtornos caracterizados pela incapacidade do ego em comandar a atenção mas, tudo bem, contanto que essa atenção esteja sob o comando da autoridade. O mundo está repleto de zumbis cuja atenção é controlada por terceiros, que vivem em função de terceiros e a medicina não demonstra preocupação alguma com isso. Portanto é mentira que a preocupação médica seja com a capacidade de “auto-regulação” do TDAH. O que se busca é conformidade e submissão à regulação social tão somente.

Já sabemos portanto que o problema social na atenção espontânea é o fato de ela ser uma atenção desobediente. Sabemos disso porque vimos que a medida da atenção é artificial. O tipo de atenção mensurada para chegar a esse diagnóstico é exclusivamente a atenção “comandada”. Alguém dirá ao examinado, “preste atenção nisso”, mas a atenção espontânea não obedecerá ao comando do pedagogo, psicólogo ou de seja quem for, nem mesmo ao comando do próprio sujeito, ao menos se ele diabolizar-se a ponto de não confiar em sua própria e prodigiosa máquina de percepção.

O neurotípico, por sua vez, abre mão de qualquer sentido de relevância para aderir ao objeto proposto, seja qual for. Sua atenção não tem critério. É um mero instrumento para a execução de tarefas. A medicina deu um nome pomposo a essa submissão irrefletida a qualquer ordem: “função executiva”. A capacidade de executar sem refletir, sem questionar, sem se distrair. Executar até pessoas, se for o caso. Não digo com isso que pessoas de atenção livre não sejam tão capazes de matar quanto um neurotípico, mas certamente matarão por suas próprias razões, os burocráticos guardas de Auschwitz deviam ser provavelmente neurotípicos de primeira ordem.

Uma vez elucidado o eixo principal, a situação revela-se simples. Muitos têm a capacidade de escravizar a mente, se engajando em coisas que não lhes dizem respeito, enquanto poucos são instintivamente atraídos pelo Sentido, coletando padrões a sua volta graças a uma natureza de atenção difusa, que não deixa escapar detalhes secundários, mais significativos, e que salta espontaneamente de um foco para outro sem pedir permissão a ninguém. Estes últimos, são agentes de atenção livre, enquanto a maioria tem atenção servil, escrava, prisioneira.

A maioria é muito útil, sem dúvida. Tornou-se ainda mais útil nas civilizações organizadas, hierarquizadas e industriais. Afinal, alguem tem que fazer o trabalho burro enquanto não se inventa uma máquina que o faça melhor. Numa sociedade escravista e destruidora da liberdade como a que vivemos, essa maioria é necessária enquanto a minoria livre é, no mínimo, indesejável. A minoria será por isso patologizada com termos negativos como “síndrome”, “déficit” ou “complexo”.

Chegamos ao ponto em que, se você leu até aqui, não precisamos mais enfeitar o bolo. Se você nasceu com a atenção livre no mundo de hoje, parabéns: você será triturado, humilhado, destruído e excluído.

Embora sejam minoria, os de atenção livre não são ainda minoria o bastante para a sociedade totalitária light em que vivemos hoje. As estatísticas são curiosas: aparentemente uma ou duas em cada 10 crianças nascem com sua atenções livres enquanto outras oito ou nove já nascem prontas para a escravidão atencional. Entre adultos, no entanto, o “diagnóstico” se reduz a 2 ou 3 em cada cem. Como queríamos demonstrar, os demais quase duzentos sujeitos que nasceram com a atenção livre foram devidamente eliminados da face da terra, ainda que seus corpos socializados ainda perambulem por algum escritório, consultório psiquiátrico ou farmácia da nossa civilização.

Nem sempre foi assim. O que nossa tirania pseudocientífica e pseudomédica chama de “desordem” ou “síndrome”, é comprovadamente um caráter genético dominante, não regressivo. Isso significa que a atenção livre e espontânea foi selecionada ao longo de dezenas de milhares de anos da história natural da nossa espécie e provavelmente cumpriu um papel vital na sobrevivência da humanidade. Estudos de campo conduzidos por antropólogos identificaram que, entre comunidades tradicionais, crianças com traços de atenção livre ganham preferência e privilégios na criação, exatamente ao contrário do que fazemos nas sociedades urbanas de hoje.

O motivo é óbvio para qualquer mente que não seja docilmente escrava. Imagine um estouro de manada. As mentes de atenção complacente irão diretamente para o abismo, restando aos distraídos, céticos, criativos e curiosos a tarefa de pôr os cornos à frente e acima da manada.
A ideia nutrida por nossa civilização psicopata, de um mundo ideal sem pessoas com atenção espontânea, é na verdade um mundo governado por escravos e condenado à autodestruição por meio de uma foco atencional disfuncional.

O que vivemos hoje é uma ditadura de escravos. A maioria obediente, alienada de sua própria atenção, com seus critérios de escravo, julga a minoria livre. Assim, o que ocorre é que os livres estão sendo constantemente condenados e menosprezados por não se comportarem como escravos. O procedimento começa na escola, essa instituição imbecilizante, onde os livres são marginalizados porque não param quietos nem prestam atenção à cartilha de verdades gnósticas irrefletidas, apresentada por escravos e para escravos.

A pergunta proibida, verdadeiro tabu no mundo acadêmico dos escravos, é: como você sabe? Os livres não podem evitar essa pergunta. De onde veio isso que você está fingindo que ensina? Porque isso é verdade? Perguntas que tem respostas, mas que custam caro a quem as faz. Custam exposição ao ridículo, acusação de rebeldia vazia e por aí vai… A ordem é: não pergunte, absorva. Preste atenção apenas ao comando e nada mais. Para a maioria, esse comando é uma benção que os protege de perceber se apavoram diante da exuberância do Cosmo. Para a minoria livre aquele é um comando que simplesmente não tem como ser seguido. Os livres não são capazes de se deixar escravizar e aí está seu caráter imperdoável.
O que acontece então, são os jogos de denúncia. O mundo de funções insignificantes, tarefas irrelevantes e burocracias sem sentido dos escravos é tabuleiro de jogo obrigatório para todos, inclusive os livres. Desde a infância, os livres são submetidos às pegadinhas que provocam suas “falhas” em manter os olhos na trilha, como os cavalos de viseiras naturais que são os escravos. Essas rejeições constantes vão destruindo o espírito dos livres que, mais cedo ou mais tarde, começam a questionar até mesmo a verdade auto evidente. Ao cabo de uma vida sem nenhum endosso social, os livres se transformam em fantasmas e,num mundo doente, duvidam da própria sanidade.

Entendamos o seguinte: os livres não servem para trabalhos de escravos. Hoje 99% dos trabalhos são feitos sob medida para escravos. Desde os mal remunerados até o CEO de uma empresa ou Ministro de Estado, há escravos ordinários e escravos de luxo, mas são todos escravos. Trabalho gerencial ou administrativo é o trabalho escravo por excelência. Existe um tipo de mente embotada, tão desinteressada da vida, que é capaz de manter atenção àquela estupidez por 40 ou 60 horas semanais. A maior parte dessas horas é dedicada desavergonhadamente ao cortejo social, a língua franca dos escravos. Aqueles são trabalhos subalternos, não importa o poder e o dinheiro que envolvam. Um executivo típico é menos livre que uma vaca de curral. Se você quiser uma heurística para identificar um trabalho subalterno, observe a forma como o sujeito se veste. O terno e gravata, especialmente em climas quentes, é identificador inequívoco de um trabalho subalterno, conduzido orgulhosamente por um escravo de luxo. É marca do sujeito de atenção livre sentir-se torturado nesse tipo de trabalho. Neurotípicos também sofrem ali, sem dúvida, mas para a atenção livre, o trabalho vazio é uma câmara de horrores, capaz de moer sua alma.

Os livres, no mundo de hoje, só conseguem um mínimo de aprovação social em trabalhos criativos ou papéis de liderança. Ali, suas características naturais produzem os devidos resultados. Indivíduos de atenção livre são maioria entre artistas, empreendedores (mas não gerentes), criadores, inovadores, descobridores, pensadores, etc. Note que todas essas atividades têm uma característica em comum: ao mesmo tempo em que são cercadas de glamour, também são objeto de todo tipo de preconceito. São entendidas como ambições infantis, a princípio inalcançáveis, quase sempre desaconselhadas por famílias e tutores. Isso ocorre porque essas atividades realmente são assim para a maioria escrava, incapaz de criar ou de deixar a atenção fluir. São também entendidas como profissões de degenerados, drogados e extravagantes. Acima de tudo são acessadas preferencialmente por gente de elite porque são as pessoas de classe alta que têm a melhor chance de escapar, sobreviver ou ser protegidas do labirinto de humilhações e testes fraudulentos que o mundo impõe aos livres. São também as carreiras com as distribuições de renda mais desiguais e com os critérios de mérito mais subjetivos. Nesses espaços controlados, criados para a colheita dos resultados das capacidades exclusivas dos livres, a única coisa capaz de protegê-los são as relações sociais. Livres, quando bem relacionados (o que é raro), mesmo com todas as dificuldades, podem ter uma chance na vida. Claro que isso só ocorre nas classes altas. Já um pobre livre é um pobre morto.

Essas profissões vivem um estado de escassez artificial promovida pelo sistema escravista da sociedade psicopática moderna e imposta pela economia perversa dos neurotípicos. Gerida por escravos, a peneira dessa pirâmide precisa ser cruel já que, como vimos nas estatísticas, é preciso 198 escravos para controlar cada dois indivíduos livres. A regra nessas profissões é um esquema de pirâmide programado para dissuadir qualquer pessoa de bom senso de sequer tentar. Uma ínfima minoria concentra todos os ganhos da profissão enquanto os demais são ridicularizados e humilhados até desistirem da profissão ou da vida. Essa distribuição vem em detrimento inclusive dos livres que logram alçar o topo da pirâmide. Superexplorados até a exaustão da própria criatividade e submetidos ao escrutínio da atenção de multidões de escravos, os mais destacados pensadores e criadores são transformados em atrações circenses e torturados até o derradeiro fim, em que servem de bode expiatório para alguma histeria persecutória típica da dinâmica social dos escravos.

Não há razão alguma para tamanha concentração ou escassez no mundo de hoje a não ser o sadismo pelo qual os escravos se vingam dos livres. Hoje não faltam trabalhos remunerados para gerentes, assistentes e auxiliares administrativos absolutamente inúteis fazendo trabalhos que não agregam absolutamente nada ao mundo. De alguma forma o sistema encontra dinheiro para dar a essas pessoas. Mas remunerar mentes livres para criar e empreender parece um sacrilégio. O resultado é uma multidão de aspones e pilotos de excel, enquanto 999 em cada mil músicos não conseguem pagar o aluguel. No mundo dos escravos, remunerar a criatividade e atenção livre é premiar a boa vida. A lógica do escravo é a lógica da inveja. Os escravos gostariam de ser como os livres e, no fundo, os vêem como privilegiados. Então pensam: “Como podem os livres, além da liberdade do sentido e da criação ainda querer aprovação social e dinheiro? De jeito nenhum!”

O que fazem os livres nesse mundo? A maioria sucumbe, o que ajuda a professia auto-realizada do diagnóstico, explícito ou implícito, de TDAH, depressão, ansiedade ou bipolaridade e alimentam as taxas de suicídio três ou quatro vezes mais altas do que entre os neurotípicos. O que assistimos hoje é, sem sombra de dúvida, um genocídio sistemático da população de atenção livre.

Alguns encontram estratégias de sobrevivência e um dos propósitos deste texto é justamente falar disso. Cafetinar o diagnóstico é a mãe das estratégias de sobrevivência. É o que todas as outras minorias fazem. Façamos o mesmo.

Ser diagnosticado é uma benção. Primeiro, porque assim você descobre que não tem talento para a escravidão, que por si só é uma boa notícia. Depois, porque apesar de todos os equívocos e canalhices, maliciosas ou bem-intencionadas, que incluem todos nesse processo, muitas coisas finalmente ficaram explicadas sobre você e sobre como te tratam. O segredo, nesse momento, é fingir que acredita na baboseira sobre TDAH ser desabilitante, exorcizar qualquer traço de autopiedade que esse discurso queira incutir em sua mente e entender o fundamental: eles morrem de medo de você porque você é superior a eles.

Entenda: atenção livre é uma maldição e uma benção. É uma benção porque é melhor ser brilhante e criativo, sensível e perceptivo do que medíocre, normal, obediente e esforçado. É uma maldição porque este mundo odeia quem é sensível, perceptivo e criativo e só gosta de quem é medíocre e obediente. Você precisa jogar o jogo deles, usar malícia contra malícia. Só assim você sairá do lugar de inferioridade em que eles querem te colocar e poderá gozar da liberdade que é de sua natureza. Para isso você precisa desistir completamente da ideia de ser como eles. Não somos, nunca seremos e jamais desejaríamos ser com eles, porque somos melhores. Então aceite o diagnóstico. Ele não muda nada sobre o que você sempre soube sobre si mesmo, sobre seu mundo interior e sobre o que você é capaz de ver.

Quanto ao tratamento: não há. Não se “cura” uma vocação nem se “remedia” um talento. Nada que você faça te tornará “menos TDAH”. Lembre-se: você não quer isso. Quanto aos remédios: experimente. Algumas pessoas não se dão bem com eles, outras se dão. Minha experiência comigo mesmo e pessoas próximas é que os remédios não vão roubar nada do brilho de sua personalidade, seu prazer de viver, suas ricas divagações sobre o mundo. Mas os remédios vão te ajudar a derrotar os neurotípicos no jogo deles. Eles vão comer poeira. Um indivíduo de atenção livre, quando medicado, faz o trabalho de dez escravos. De quebra você rouba deles todas as razões pra te marginalizar. Aprenda a se organizar, não se atrase, não esqueça das bobagem de que fazem tanto questão que você se lembre. Existem técnicas para essas coisas. Uma a uma, elimine as armas deles contra você. Nada disso mudará na sua natureza.

Depois que você tiver feito isso. Encontre seus irmãos. Junte-se a nós e vamos dar aos neurotípicos o mesmo tratamento que temos recebido. A melhor forma de constrangimento é a competência. Se somos transtornados e deficitários, como dizem, vamos ver como eles se sentem perdendo de goleada para um time de deficientes. Conclamo todos os dotados de atenção livre a vir a público, ousar dizer seu nome, afirmar sua natureza e colocar os escravos em seus devidos lugares. O mundo precisa de idéias, de liderança, de criatividade. Esse é o nosso trabalho. O deles é obedecer. Livres do mundo, uni-vos.

Daniel Mattos

Daniel Mattos

Nasceu em Petrópolis, em julho de 1975 e recebeu o nome de Daniel Vidal Mattos. Desde então está em busca de respostas sobre o que é ser Daniel Vidal Mattos, nascido em Petrópolis em julho de 1975. Não se parece com a foto aqui publicada.

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