III. A Invasão da Escola

III. A Invasão da Escola

(Antes: II. Bang!)

O estampido alto, seco, provoca um estado de pânico no colégio. No refeitório dos professores, todos ficam imediatamente alertas, o medo estampado nos rostos. No pátio, os alunos correm para se abrigar nas salas. Depois de um momento atônito, a diretora resolve ligar para a polícia. O servente da escola, que também servia como inspetor e segurança, tentava avaliar onde aquilo tinha acontecido, mas o pavor também lhe embotava as ações.

No banheiro, Emil destranca a cabine e olha para o corpo de Chico caído no chão, com um buraco vermelho ao lado do nariz. Uma poça de sangue começava a se formar atrás da cabeça. Agora a excitação tinha superado o medo. Guardou a pistola novamente na mochila, e antes de sair do recinto espiou pela porta, para se certificar de que ninguém estava olhando. O pátio já estava completamente deserto, mas ele podia escutar alguns gritos abafados e muito choro. Discretamente, Emil entra em uma sala de aula perto do banheiro, vazia.

Poucos minutos depois, ele já podia ouvir as sirenes da polícia, que cercava o colégio. Emil esperou sozinho até que um soldado vestido para a guerra dá um pontapé na porta da sala, estourando a fechadura. Vendo apenas um menino na sala, o encapuzado faz um sinal para fora. Outros agentes invadem o corredor da escola, armados até os dentes, e se espalham pelo resto do pátio.

– Tudo bem com você, garotinho? – pergunta o policial, tentando passar tranquilidade.

Emil assente com a cabeça, enquanto escuta o barulho de várias outras portas sendo arrombadas, e a correria das demais crianças que deixam as salas de aula. Um dos soldados grita para o chefe da operação:

– Aqui no banheiro, senhor! Temos um ferido!

O agente faz um sinal para que Emil o acompanhe, e o leva em segurança para a mesma sala onde estão alguns professores e alunos maiores. Ainda excitado, ele observa a expressão transtornada em cada rosto, e parecia sentir até prazer naquilo. Segundos, minutos e horas se confundem em soluços, abraços e um sentimento de comoção geral e absoluto espanto.

Depois que a diretora do colégio é chamada pela polícia para ir ao banheiro reconhecer o corpo, passam poucos minutos até que um berro histérico rompe aquele clima de tensão. Os outros também deixam a sala para ver o horror com os próprios olhos. Um burburinho já toma conta do pátio externo novamente, enquanto Emil fica sozinho. Ou quase. Dona Ruth, a mesma professora que já tinha lhe repreendido durante a aula, não tirava os olhos do menino.

– Emil, você sabe o que aconteceu, não sabe? Desembucha, moleque!

Emil continua calado. Ruth então se aproxima dele, ameaçadora.

– Eu sei que você ta escondendo alguma coisa, menino…

Sem esperar que a professora o alcance, Emil corre por um corredor interno e entra no refeitório vazio dos funcionários, que funcionava numa sala anexa. Dona Ruth segue o garoto, com a mesma expressão raivosa que tinha despertado nele o alerta de autodefesa.

– Não adiantar fugir, seu merdinha! Você vai me contar agora o que aconteceu naquele banh…

A professora não consegue terminar a frase, atingida com um tiro no peito no momento em que entrava no recinto. O pânico volta a tomar conta do local, e dessa vez a gritaria é ainda mais forte, ainda mais desesperada. Emil guarda a arma de volta na mochila e corre até uma porta dos fundos, onde dá uma volta quase completa ao redor do prédio antes de ser interceptado por outro policial, que age rapidamente para protegê-lo, atrás de uma amurada de concreto.

Os agentes de segurança não podiam compreender como outro assassinato tinha ocorrido no colégio, quando eles já dominavam o perímetro. Conduzindo uma verdadeira operação de guerra, todos são conduzidos para o auditório da escola, completamente fechado. Professores, funcionários e alunos são confinados ali, dessa vez por um bom tempo. Já era noite quando os policiais liberam o acesso, interrogando todos os adultos. Até mesmo os alunos adolescentes são revistados. Somente as crianças tinham sido poupadas. Nenhuma pista.

No portão da escola, pais e familiares dos alunos estão em prantos, dividindo a cena com curiosos e muitas câmeras de TV, que transmitem a tragédia em tempo real. Pouco a pouco, com exceção da família de Chico e da professora Ruth, o desespero geral dá lugar ao choro de alívio. As crianças vão para casa abraçadas com pais, mães e avós. Funcionários e professores conversam lívidos, com muita dificuldade para entender o que aconteceu.

O detetive Max tinha acabado de recolher todos os depoimentos e evidências, e já se preparava para ir embora quando percebeu Emil sozinho perto do portão. Ninguém tinha ido buscá-lo.

– Ei, garoto. Quer uma carona?

Para não ter de andar sozinho à noite, e evitar dar de cara com a gangue de jovens drogados que sempre o aterrorizava na vizinhança perto de casa, Emil aceita a proposta.

Durante a curta viagem de carro até o bairro de Emil, que vai indicando ao policial para onde seguir, Max poupa o menino de falar sobre o acontecido. Já devia ter sofrido o bastante naquele dia horrível. Quando chegam ao destino, porém, o detetive não tem como deixar de notar a confusão que está instalada na residência. A mãe e o padrasto de Emil estavam tendo mais uma daquelas brigas violentas, e os sons das agressões e objetos quebrados eram mais do que perceptíveis. Assim que o garoto abre a porta do carona para saltar do carro, Max toca em seu ombro e pergunta, num tom de pena e apreensão:

– Está tudo bem, garoto? Tem certeza que deseja ficar?

Emil lança um olhar penetrante para o detetive, mas responde com segurança:

– Sim. Agora eles não podem mais me fazer mal.

(Continua: IV. Serial Killing)

Marcial Renato

Marcial Renato

Marido da Karin, a mulher mais bonita que já conheci na vida, pai da Ravena (super poderosa), do Henzo (a pronúncia é "Renzo", como o lutador) e da Laura (de olhos verdes). Filho da Alzira, a mulher mais forte do mundo, e do Paulo Roberto, o cara mais maneiro de todos os tempos. Já trabalhei como produtor de TV, Cinema e Internet, fui professor de Comunicação Social e hoje sou servidor de carreira da Agência Nacional do Cinema (ANCINE). Tenho um mestrado em Literatura e graduação em Publicidade e Propaganda, ambos na UFRJ. Em 2012, escrevi, produzi e dirigi o longa-metragem "Dia de Preto", com Daniel Mattos e Marcos Felipe Delfino, premiado em diversos festivais no Brasil e no mundo. Também sou autor dos livros "Rituais de Casamento", de 2015, junto com a Karin, e "Asgaehart: as invasões bárbaras", lançado em 2018. Duas vezes por ano jogo na lateral direita do time dos nascidos na década de 70 do Vale do Rio Grande (7X). Também gosto de pegar onda no verão, e nas horas vagas escrevo aqui no site da Maxie.

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