III. Fuga no Shopping
Santoro se desespera. Não iria pular ali nem fudendo.
Mesmo com as mãos amarradas, ele decide realizar um lance arriscado. Na verdade, não havia outra opção. Estava literalmente a um passo do caldeirão. Quando um dos mascarados tenta mais uma estocada em sua direção, Santoro usa a corda amarrada em seu pulso para envolver a ponta da lança, e puxa a arma das mãos do sujeito!
Com um movimento desesperado, ele toma impulso e usa a lança como uma vara para saltar sobre o caldeirão. O salto é quase perfeito, mas Santoro acaba pisando na borda do enorme recipiente metálico, que tomba ao chão, derramando parte do líquido borbulhante sobre os participantes do ritual, e sobre ele mesmo!
Sentindo as pernas queimarem, ele aproveita o tumulto para correr o mais rápido que pode. O líder encapuzado se enfurece com o que parece ser um verdadeiro sacrilégio para os integrantes da bizarra seita:
– Batanka nu ku! Batanka nu ku!
Santoro percebe que aquilo era uma ordem para que o pegassem. Sem olhar para trás, dispara pelos corredores do shopping, com uma dúzia de mascarados em seu encalço. O pesadelo era real. Ele continuava gritando por socorro, mas logo se dá conta de que não havia ninguém ali para ajudá-lo. Sobe uma escada rolante desligada, dobra uma esquina de loja e chega à praça de alimentação, onde se livra da corda com os dentes e busca algum local para se esconder.
Os mascarados chegam ao local e se espalham para procurá-lo em toda a parte. Entram em restaurantes, reviram balcões e mesas. Nada. Um deles grita para os outros, e todos saem dali por um corredor, continuando a busca. Nesse momento, Santoro se levanta do meio de um chafariz que decora a praça de alimentação, completamente encharcado, com um canudo de papel na boca. Alívio! Pelo menos por enquanto, tinha conseguido despistar aqueles loucos assassinos.
Esgueirando-se pelas sombras, Santoro segue por um corredor de serviço até o que lhe parece ser uma central de segurança do shopping. Na sala, repleta de monitores de vídeo, ele tenta usar um telefone fixo, o que pode ser a sua salvação. Logo de cara, ele liga para a polícia.
– 190, Emergência.
– Graças a Deus! Olha só, minha senhora, eu tô aqui no shopping, e tem um bando de malucos querendo me matar!
– Nome, RG e endereço, senhor.
– RG?! Você ficou louca? Qual a parte de “estão querendo me matar” a senhora não entendeu?!
A atendente fica em silêncio do outro lado da linha. Ainda nervoso, Santoro sente que a exigência era séria.
– Peraí, peraí… Deixa eu ver aqui no documento.
Ele apalpa o bolso da calça para pegar a carteira de motorista, que infelizmente se encontra molhada, em frangalhos. Impossível ver o número.
– Olha só, minha senhora… Eu tive que mergulhar na porra de um chafariz pra escapar dos caras, e meu documento foi pro caralho! Por favor, manda uma patrulha pra cá agora!
– Lamento, senhor. Sem estas informações nada poderemos fazer.
– Por favor, moça! Eu tô MUITO fudido aqui nesse shop…
A ligação é encerrada. Com raiva, Santoro liga de novo. A mesma voz atende.
– 190, Emergência.
– Olha, moça! Eu to falando sério pra caralho! Tão querendo me matar aqui no shopping! Dá pra mandar uma patrulha pra cá agora?! Por favor!
– Senhor, saiba que podemos rastrear sua ligação e processá-lo por desacato à autoridade.
– Isso! Pode rastrear! Vocês vão ver que eu não tô passando trote nenhum, PORRAAA!
– A essa hora da madrugada os shoppings já estão fechados, senhor.
– Eu sei! Eu sei! Mas eu dormi no banheiro e agora…
A atendente encerra novamente a ligação.
Desesperado, Santoro desiste da polícia e tenta ligar para casa.
– Aqui fala o Dr. Paulo Roberto de Salvador Delfino. No momento não podemos atender. Após o sinal, deixe seu nome e telefone, obrigado.
Era a porra da secretária eletrônica. Tenta o celular de seu pai, dá no mesmo. Sua mãe, seu irmão, todos já estão dormindo. A contragosto, liga para o celular de Luana. Uma voz masculina atende. Santoro estranha.
– Alô, eu poderia falar com a Luana? É urgente, por favor.
– Ela tá dormindo agora. Quer deixar recado?
Santoro fica ainda mais puto e desliga na cara do sujeito. Puta que o pariu. O que mais podia dar errado?
(Continua: IV. Todos Contra Um)
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